Linguagem inclusiva e acessível como pilar fundamental da produção de conteúdo humanizado

Laíze Damasceno

Laíze Damasceno

fundadora da contehuma_

É comum que a primeira associação a ser feita quando ouvimos o termo “conteúdo humanizado” esteja relacionada à produção de conteúdo que considere e se preocupe com as pessoas. Mas, de quais pessoas estamos falando?

A busca por conteúdos que geram maior conexão e identificação entre o público e as marcas ganhou muita força nos últimos anos, e trouxe novas tendências, como a escrita humanizada.

Para alcançar este objetivo, a definição de um público alvo específico e personas bem definidas na criação das estratégias é ainda mais essencial. A questão é: as marcas têm considerado e respeitado a diversidade na hora de planejar e executar suas estratégias de comunicação?

O uso das linguagens inclusivas e acessíveis são formas de garantir que todas as pessoas possam acessar e consumir os conteúdos compartilhados, compreendendo a mensagem transmitida e sem promover exclusões ou preconceitos de qualquer natureza.

Esse é um tema que gera debates e dúvidas, além de resistência de alguns grupos que são opostos às mudanças.

Por isso, preparamos este artigo para que você compreenda no que consiste cada linguagem e de que forma estas podem ser aplicadas no conteúdo da sua marca e apoiar a transformação positiva da sociedade. 

Qual a diferença entre a linguagem inclusiva e a linguagem acessível?

Dois termos frequentemente surgem lado a lado: linguagem inclusiva e linguagem acessível. Embora pareçam similares à primeira vista, elas abordam aspectos distintos da comunicação.

A linguagem inclusiva se concentra em formas de expressão que reconhecem e respeitam a diversidade de identidades, gêneros, orientações sexuais, habilidades e experiências de vida. 

Por outro lado, a linguagem acessível visa tornar a comunicação compreensível e utilizável por todos, independentemente de suas capacidades cognitivas, sensoriais ou físicas.

A confusão entre esses conceitos muitas vezes ocorre devido à sobreposição de seus objetivos finais, que é promover uma comunicação mais inclusiva e equitativa.

Linguagem inclusiva e linguagem neutra são sinônimos?

Essa é uma dúvida comum, mas a linguagem neutra e a linguagem inclusiva têm objetivos e métodos de aplicação diferentes.

A linguagem neutra evita a atribuição de gênero a pessoas ou objetos, buscando uma linguagem mais imparcial e equitativa. Seu principal objetivo é eliminar a presunção de gênero masculino ou feminino em termos ou expressões.

As mudanças se aplicam a adjetivos, substantivos, pronomes, artigos e preposições, com a exceção de animais ou objetos. Existem também os sistemas “elu”, “ile”, “ilu” e “el”.

Exemplos:

  • Elu comprou um celular novo.
  • O carro azul é dile.
  • Ilus foram ao cinema.
  • Els assistiram ao filme na TV.

O uso do “@” ou “X” como forma de aplicação da linguagem neutra, apesar de comum principalmente nas redes sociais, não é recomendado. Por serem impronunciáveis na oralidade, dificultam a acessibilidade ao conteúdo, já que os softwares usados para auxiliar na leitura de textos não reconhecem as palavras com esses marcadores. Assim, a intenção de incluir se torna uma forma de exclusão. 

Enquanto a linguagem neutra propõe alterações gramaticais, a linguagem inclusiva busca alterar a estrutura das frases de forma a não identificar gêneros, além de não reproduzir estereótipos e preconceitos. 

No próximo tópico vamos entender mais detalhes da linguagem neutra e como aplicá-la.

Como aplicar a linguagem inclusiva e acessível na minha comunicação?

Para garantir que seu conteúdo seja inclusivo, entenda o seu público em sua multiplicidade, escolhendo uma linguagem que possa ser compreendida por todos. 

Reflita se o uso de estrangeirismo ou siglas podem prejudicar o entendimento ou se o uso de uma linguagem mais formal não vai se tornar uma forma de segregação do público.

Fique atento também às palavras e expressões que possam reforçar estereótipos ou preconceitos em relação a grupos específicos. Escolha termos que não perpetuem noções preconcebidas sobre raça, etnia, orientação sexual, identidade de gênero, habilidades, entre outros.

Na formação das frases, opte por estruturas que não sejam determinantes e exclusivas no que tange ao gênero. Veja alguns exemplos:

  • Em vez de: “Cada aluno deve trazer seu livro para a aula.”

Use: “Cada estudante deve trazer o seu livro para a aula.”

  • Em vez de: “O cliente deve apresentar sua identificação para retirar o produto.”

Use: “A pessoa que realiza a compra deve apresentar a identificação para retirar o produto.”

  • Em vez de: “O motorista deve respeitar as leis de trânsito em sua cidade.”

Use: “Quem dirige deve respeitar as leis de trânsito em sua cidade.”

Quanto à acessibilidade, cada formato de conteúdo demanda ações específicas para que sua compreensão seja garantida. Aqui alguns exemplos:

  • Vídeos

1. Legendas: Adicione legendas ao vídeo para torná-lo acessível para pessoas surdas ou com deficiência auditiva. As legendas devem incluir todos os diálogos, bem como sons importantes que contribuem para o entendimento de uma cena, uma situação ou contexto. 

2. Audiodescrição: Para pessoas com deficiência visual, adicione uma faixa de áudio que descreva o que está acontecendo no vídeo, incluindo ações, expressões faciais e elementos visuais importantes.

3. Transcrições: Forneça uma transcrição do conteúdo do vídeo para permitir que pessoas surdas ou com deficiência auditiva tenham acesso ao texto completo do que está sendo comunicado no vídeo.

4. Controles de reprodução acessíveis: Certifique-se de que os controles de reprodução do vídeo sejam facilmente acessíveis e operáveis por pessoas com diferentes habilidades motoras. Isso pode incluir opções de controle de reprodução por teclado e botões de tamanho adequado.

  • Texto

1. Fontes e tamanhos ajustáveis: Permita que os usuários ajustem o tamanho e o tipo de fonte do texto para atender às suas necessidades individuais de leitura. Isso é especialmente importante para pessoas com baixa visão.

2. Contraste: Garanta que haja um bom contraste entre o texto e o fundo para facilitar a leitura, especialmente para pessoas com baixa visão ou dislexia.

3. Organização e estruturação clara: Utilize uma estrutura clara no texto, com títulos e subtítulos descritivos, listas numeradas ou com marcadores e parágrafos bem espaçados para facilitar a compreensão e a navegação.

  • Áudio

1. Transcrições: Para conteúdos de áudio, forneça uma transcrição completa do conteúdo para permitir que pessoas surdas ou com deficiência auditiva tenham acesso ao texto que está sendo comunicado.

2. Legendas: Se o áudio for acompanhado de vídeo, adicione legendas para tornar o conteúdo acessível para pessoas surdas ou com deficiência auditiva.

3. Descrições de áudio: Se houver informações visuais importantes sendo transmitidas por meio do áudio, como em podcasts ou programas de rádio, forneça descrições verbais dessas informações para garantir que todos os ouvintes tenham acesso ao conteúdo completo.

E, acima de tudo, pratique a empatia e o respeito em todas as suas interações. Reconheça que cada pessoa é única e que ela deve ser tratada com dignidade e consideração, independentemente de sua identidade ou experiência de vida.

Quais são os principais desafios para a ampla aplicação da linguagem inclusiva e acessível?

Mesmo tendo uma grande importância no quesito de incluir e representar a multiplicidade de pessoas que compõem uma sociedade, o uso dessas linguagens encontra desafios.

O preconceito é um dos maiores e se desdobra de diversas formas, pois cria obstáculos à inclusão e à acessibilidade ao promover a exclusão, desvalorização e estigmatização de grupos marginalizados, dificultando a aceitação e implementação de práticas de comunicação inclusivas e acessíveis.

O comportamento preconceituoso costuma se basear na falta de empatia (ao não considerar as realidades de outras pessoas), no patriarcado (por promover normas de gênero rígidas, perpetuar estereótipos sexistas e limitar a diversidade na participação social) e na dificuldade em reconhecer e valorizar experiências não normativas (privilegiando experiências e perspectivas que se encaixam dentro das normas de gênero estabelecidas).

Além disso, a resistência à mudanças também precisa ser superada. Sua causa pode estar relacionada ao preconceito e ao comodismo em manter o que já está estabelecido como norma imutável, apenas para evitar o esforço em fazer diferente.

Essa resistência se manifesta desde a recusa em adequar a linguagem oral e escrita até a criação de legislações que atrasam ou bloqueiam mudanças (como a proibição de linguagem neutra em órgãos públicos aprovada pela Câmara dos Deputados).

Existem pessoas que se posicionam contra as mudanças de linguagens devido a necessidade de atualizar o sistema de ensino de jovens e adolescentes, ou afirmando que tal alteração não irá impactar no preconceito que esses grupos sofrem.

Todavia, a identificação que o uso das linguagens inclusivas e acessíveis promove em diversos grupos é capaz de realmente transformar vidas e gerar oportunidades para que cada vez mais pessoas diversas ocupem espaços antes restritos e excludentes.

Outro obstáculo é o alinhamento entre as tecnologias inclusivas. Diversos softwares foram e continuam sendo desenvolvidos, principalmente para garantir uma maior acessibilidade nas mais diversas áreas.

Um exemplo é o Unicode, que é um padrão de codificação de caracteres que visa representar textos e símbolos de praticamente todos os sistemas de escrita existentes no mundo ao atribuir um código único a cada caractere. Dessa forma, o sistema possibilita que eles sejam representados de forma consistente em diferentes plataformas, sistemas operacionais, línguas e aplicativos.

Mas, para que uma tecnologia tão robusta possa ter o máximo de aproveitamento, as outras tecnologias precisam estar integradas e evoluir juntas, para que o desenvolvimento não seja segmentado e possa contribuir com a sociedade de forma ampla.

Perceber tantos desafios enfrentados faz com uma pergunta surja: a implementação dessas linguagens é de fato possível?

O uso da linguagem inclusiva e acessível é uma possibilidade real na produção de conteúdo?

Sim, mesmo com os desafios e resistências, o uso da linguagem inclusiva e acessível é uma possibilidade real e cada vez mais promissora, principalmente na produção de conteúdo.

Embora existam obstáculos a superar, como preconceitos estruturais, falta de conscientização sobre o tema e resistência à mudanças, há também um crescente reconhecimento da importância da inclusão e acessibilidade na comunicação.

Muitas organizações, instituições e comunidades estão adotando práticas de linguagem inclusiva e acessível como parte de seus esforços para promover a equidade e a diversidade.

Além disso, fazer a sua parte e criar conteúdos que respeitam e valorizam a diversidade são formas de reafirmar o seu compromisso em contribuir para uma sociedade melhor, que proporciona acolhimento e oportunidade para todos.

Humanizar a comunicação é reconhecer a pluralidade, de todas as formas.

Conclusão

A linguagem inclusiva e acessível emerge como um pilar fundamental na produção de conteúdo humanizado, que verdadeiramente reconhece e valoriza a diversidade de identidades e experiências.

Embora ainda existam desafios, a implementação dessas linguagens é, não apenas possível, mas cada vez mais necessária e promissora. A mudança pode gerar desconforto inicial, mas os benefícios que ela traz são imensuráveis.

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